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PodTEXT | Como perder o medo de começar a investir?

Tem medo de investir? Investir assusta-o? Ouça o episódio desta semana. Explico quais são os primeiros passos para começar a investir sem medo. Sei que não é fácil, porque passei pelo mesmo. Lembro-me de que a minha mão tremia quando subscrevi o meu primeiro produto sem capital garantido. Experiências dramáticas de lesados de bancos e histórias de pessoas que perderam muito dinheiro também não ajudam e até reforçam a nossa convicção de que é melhor nunca arriscar nada.

PodTEXT | Como perder o medo de começar a investir?

[Introdução - Pedro Andersson]

Olá! Sou o Pedro Andersson, jornalista especializado em finanças pessoais, e aproveito as minhas viagens de carro para falar consigo sobre dinheiro. Faço de conta que vai sentado ou sentada aqui ao meu lado e vamos arranjando maneiras de rentabilizar o nosso dinheiro e de gerir as nossas finanças pessoais com inteligência.

Recebi uma pergunta muito interessante de uma ouvinte, que acho que vale a pena desenvolver aqui um bocadinho, porque toca num ponto fundamental, que é as experiências passadas, nossas ou de outros, são ou não uma razão válida para termos muito receio de pôr o nosso dinheiro em produtos financeiros que não tenham capital garantido? 

E ela deu um exemplo, infelizmente ainda muito recente em Portugal, o caso BES, e refere que, desde que isso aconteceu, tem muito medo. Portanto, pergunta se há alguma forma de vencer esse medo e se vale a pena fazer esse esforço. Pode não valer a pena.

[Ouvinte do podcast]

Boa tarde, Pedro. Antes de mais, muito obrigada pelo trabalho que desenvolve no Contas-poupança. Ouço os seus episódios, tenho em casa alguns dos seus livros, já implementei muitas das suas dicas, outras nem por isso. Tendo em conta a minha relação emocional com o dinheiro, o meu perfil de investidor é mais conservador, tenho de admitir.

Ultimamente tem-me surgido uma questão que gostava que o Pedro falasse um bocadinho sobre e que tem a ver com o risco dos investimentos em produtos sem capital garantido. O Pedro é muito entusiasta quando se refere a estes mecanismos de investimento, até mesmo pela rentabilidade que trazem.

Portanto, tudo certo, até agora tudo bem. Mas muitas vezes fico a pensar o que é que estes produtos de investimento sem capital garantido têm de diferente, por exemplo, daqueles que foram catastróficos e que causaram a falência de bancos como o Banco Espírito Santo e o Banif, que levaram tantas pessoas a perderem tudo aquilo que tinham poupado durante todas as suas vidas.

Pessoas pobres, pessoas de trabalho, que viram de repente todas as suas poupanças desaparecerem porque as tinham aplicadas em produtos com risco associado e sem capital garantido. Portanto, a pergunta que lhe faço é: existe alguma diferença entre estes produtos e, por exemplo, os ETFs, os fundos de investimento, ou estamos a falar da mesma coisa e o risco é o mesmo?

Ou seja, podemos, de repente, perder todo o nosso dinheiro sem qualquer tipo de proteção e acabar como os lesados do BES e do Banif? Quem sabe, depois da sua explicação ou do seu comentário, fico um bocadinho mais recetiva a produtos com risco um bocadinho maior. Muito obrigada.

[Pedro Andersson]

Vamos lá conversar um bocadinho sobre isto. Mas antes acho que é importante dizer duas coisas que servem para todos os episódios deste podcast, para todos os artigos que ler escritos por mim, os livros, seja o que for. Esta ouvinte disse que, infelizmente, tem um perfil conservador, mas quero deixar muito claro que aqui não há felizmente ou infelizmente.

Se calhar, na sociedade portuguesa, a maior parte de nós foi educado da mesma forma, isto é, para termos um perfil mais conservador em termos financeiros. Foi-nos transmitida aquela ideia de que é no poupar que está o ganho e que quando a esmola é grande, o pobre desconfia. Portanto, essa é a nossa educação.

O nosso perfil conservador, a nossa personalidade financeira, foi, muito provavelmente, com raras exceções, construída com estas bases. Esses são os nossos alicerces. Isso é mau? Isso é bom? É o que é. E, portanto, eu posso ter um perfil conservador e não arriscar rigorosamente nada na minha vida financeira e ser feliz, estar descansado e dormir bem à noite. E isso não tem nada de mal.

Vai ter esses resultados. Portanto, não vai ganhar dinheiro com o seu dinheiro e, eventualmente, até vai perder um bocadinho para a inflação, ou um bocadão, ou vai conseguir manter o seu dinheiro se conseguir colocar em produtos com capital garantido que rendam no mínimo líquido a inflação. Esses são os resultados que vai ter. Se isso o deixa descansado, está tudo bem. A minha estratégia é termos paz financeira. Portanto, para ter stress, não vale a pena.

Eu era assim, por isso compreendo perfeitamente aquilo que acaba de dizer. O que descobri muito tarde é que essa minha personalidade financeira conservadora era baseada não no conhecimento, mas no medo. Quando temos medo de uma coisa e não fazemos nada para reduzir esse medo, esse medo vai limitar-nos. Isto acontece em qualquer área da nossa vida. É mesmo assim.

Acho que aquilo que pode eventualmente fazer a diferença na sua vida, e na de todos vocês que estão a ouvir, é que podem continuar a tomar as mesmas decisões conservadoras, mas sabendo porque é que estão a tomar essas decisões, de uma forma consciente.

Mas vamos lá agora ao caso que menciona. O caso BES, e outros casos equivalentes, em Portugal e no estrangeiro, não se tratou de investimentos de risco que correram mal. Tratou-se de uma coisa completamente diferente, que é burla financeira. Uma coisa é investir com risco, consciente desses riscos, outra coisa é a pessoa ser enganada.

Quando diz que várias pessoas perderam todas as suas poupanças, fruto de décadas e décadas de trabalho, porque é que isso aconteceu? Na maior parte dos casos – não estou a dizer que foram todos –, as pessoas foram ao banco para colocar as suas poupanças e foram informadas de que o produto financeiro em que estavam a colocar o dinheiro tinha capital garantido.

Ou seja, o que lhes disseram foi que tinha capital garantido, que tinha um rendimento maior e que era algo seguro. Ora, verificou-se posteriormente que era mentira. Mas as pessoas acreditavam que estavam a aplicar o seu dinheiro num produto seguro, como se fosse um depósito a prazo ou obrigações de baixo risco emitidas pelo banco.

Ora, na realidade, aquilo onde elas estavam a pôr o seu dinheiro era papel comercial de empresas do Grupo Espírito Santo, que estavam na falência. Ou seja, esse dinheiro, ou esses produtos, não tinham qualquer garantia nem do Estado, nem do Fundo de Garantia de Depósitos, por isso as pessoas sentiram-se, e bem, enganadas, porque confiaram, por falta de literacia financeira, que era como se fosse um depósito a prazo.

Nunca ninguém lhes disse que aquilo tinha risco, ou que tinha um risco muito mais elevado do que aquilo que lhes estavam a dizer. Portanto, aqui o problema não é o ter capital garantido ou não ter capital garantido, mas sim a forma como os produtos foram vendidos.

Entretanto, depois disso, e uma vez que a supervisão, nesse caso, não funcionou, foram aprendidas várias lições. Neste momento, diria que é difícil que essa situação se repita, porque aprendemos várias lições e a fiscalização, supervisão e obrigação dos bancos é muito maior.

A questão foi que as pessoas não tinham a mínima noção de que o dinheiro não estava a ir para o BES, mas sim para as empresas do grupo. E, claro, várias empresas dessas estavam em situações extremamente frágeis e quando colapsaram, toda a gente que lá pôs dinheiro perdeu tudo, ou praticamente tudo. Portanto, nesse caso, houve má informação, houve burla, houve má conduta comercial e houve uma ocultação do risco real.

E os investimentos que referiu, como PPR, ETF, fundos de investimento, como é que são diferentes desta situação? É muito diferente, porque basta o simples facto de ter feito esta pergunta para que, quando for a uma instituição bancária, vai saber o que perguntar.

Vai perguntar se tem capital garantido ou não tem capital garantido, mas não ter também é perfeitamente normal. Uma padaria não tem capital garantido, um restaurante não tem capital garantido, a sua empresa, a empresa onde trabalha, ou da qual é dona, se for o caso, não tem capital garantido. Um talho ou um agricultor, quando planta, não tem capital garantido.

Mas há coisas que são garantidas, que é ter receitas. Partimos desse princípio: enquanto uma empresa tiver receitas, vai ter rendimentos e esperamos sempre que os rendimentos sejam superiores às despesas. Porque é que estou a dar estes exemplos? Porque um ETF SP500, por exemplo, tem comissões baixíssimas e é o mais conhecido do mundo. Tem décadas e décadas de registos, portanto, não é nenhuma burla, são as 500 maiores empresas dos Estados Unidos.

Portanto, se compararmos com o BES, é logo diferente. No caso do SP500, conhecemos as empresas? Sim, são as 500 maiores dos Estados Unidos, cotadas na Bolsa de Nova Iorque. Essas empresas têm receitas e têm despesas? Sim. Portanto, para serem as 500 maiores empresas dos Estados Unidos, é porque são boas empresas à partida, não é? Desde que tenham lucro, a valorização delas vai acontecer.

Umas mais, outras menos, e se alguma for à falência, vamos imaginar que 50 – o que é um exagero –, vão à falência. Ainda lá estão 450, e essas 50 que forem à falência vão ser substituídas pelas outras 50 maiores empresas dos Estados Unidos. É assim que funciona, tem um sistema de autolimpeza. Portanto, estamos a investir num índice, num gráfico, numa média, não tem o risco de, de um dia para o outro, aquela empresa específica deixar de existir e perder todo o seu dinheiro.

Só vai perder todo o dinheiro que investir lá se as 500 maiores empresas dos Estados Unidos forem todas à falência ao mesmo tempo e não forem substituídas pelas 500 outras maiores empresas que vêm a seguir. Só por aqui já está a perceber a diferença. Estes produtos, fundos de investimento, ETFs, PPRs, têm ainda uma outra vantagem, que é sabermos o que está lá dentro. Está na ficha que nos dão.

Quando fazemos isto através de uma entidade financeira supervisionada pelo Banco de Portugal ou pela CMVM, eles são obrigados a fornecer-nos os documentos de cada produto. Abrimos essa ficha e estão lá as empresas que estão dentro desse produto. E não estamos, quando subscrevemos esse valor, a dar o dinheiro ao banco. O banco é só um intermediário. Portanto, se o banco, a instituição ou a corretora for à falência, aqueles valores que investimos em cada um desses produtos continuam a existir nas bolsas.

E, portanto, continuam a ser nossos. Não vão à falência com o banco. Aquilo que vai acontecer é que, sendo um banco supervisionado, o Banco de Portugal, ou a CMVM, vai passar os bens que não são do banco, isto é, os bens dos clientes, para outra entidade.

Portanto, se um banco vai à falência, vai ser comprado por outro. Se uma corretora vai à falência, esses bens vão depois para outra entidade que continuará a geri-los, ou então a entidade de supervisão vai perguntar para onde é que os clientes pretendem transferir os seus bens.

De qualquer forma, quando e se quiser investir, primeiro tem de escolher uma corretora ou um banco e, depois disso, vai falar com essa entidade que escolher e fazer perguntas sobre os produtos que lhe interessam. Pergunta o que acontece se a entidade for à falência, como é que é gerido, para onde vai o seu dinheiro, se corre riscos de perder tudo. Portanto, vai fazer perguntas, porque a literacia financeira faz toda a diferença para perder esse medo.

Portanto, ao investir num destes três produtos, um fundo PPR, um ETF ou um fundo de investimento, o que é que vai estar a fazer? Já sabe que esse valor vai subir e descer. Logo, não vai entrar em pânico quando isso acontecer. É normal. Por isso é que tem uma maior rentabilidade, porque tem um maior risco. Pode escolher com pouco risco, com médio risco, com alto risco, com risco altíssimo. Mas sabe o que está a fazer.

Isto é uma enorme diferença em relação ao BES e casos semelhantes. Investir com risco, mas com conhecimento, não tem nenhum problema, nem causa nenhuma ansiedade, porque está a pôr lá dinheiro que pode perder, mas também pode ganhar bastante e compensar tudo aquilo que está a perder para a inflação em produtos que têm capital garantido. Porque aí quem ganha são os bancos, não somos nós.

Então, quando pomos dinheiro sem capital garantido, sabemos que podemos ganhar dinheiro ou ver o nosso dinheiro desvalorizar conforme a evolução do mercado. É tão simples quanto isto.

Portanto, pode perder todo o seu dinheiro? Pode. Depende do produto que escolher. Imagine que escolhe ações de uma empresa. Por exemplo, vou pôr mil euros em ações da Tesla. A Tesla é só um exemplo ao calhas. Pode ganhar muito dinheiro, ou se a Tesla for à falência, pode perder tudo. Nós não sabemos o que vai acontecer com essa empresa específica.

Um fundo de investimento no seu banco, num banco clássico, mesmo pagando comissões altíssimas, alguns são rentáveis. Vai lá, pergunta como é que funciona, como é que se faz. Vai ter de preencher um inquérito, vai ter de dizer que sabe que o dinheiro pode desvalorizar e que não vai entrar em pânico com isso.

Quando o dinheiro descer, não se vai assustar nem acusar o banco de que a enganou. Quando ganhar dinheiro, pode resgatar, ganhando esse dinheiro sabendo que valeu a pena ter arriscado. Repare como a literacia financeira faz toda a diferença em relação a casos passados de burla.

Portanto, ler todos os documentos, fazer todas as perguntas e decidir em consciência e, numa primeira fase, é este o conselho que dou sempre, comece com valores pequeninos. Até perceber como é que isto funciona e ganhar confiança, começa devagarinho.

O que é que sugiro? Que comece por um fundo PPR e por um ETF. Ponha o SP500, para começar, numa corretora ou num banco conhecido, não vá para aqueles nomes esquisitos dos Facebooks e dos Instagrams. Põe 100 euros em cada um e vê como é que se sente e como é que tudo isto se comporta ao longo do tempo. Se perceber que isto afinal para si é credível, chegará a altura em que vai perder o medo.

Se não fizer nada, vai continuar alegremente com o seu perfil conservador que, como eu disse no princípio, não tem nada de mal. Não é felizmente nem infelizmente. É o que é. Ninguém obriga ninguém a investir. Quem fez isso nas décadas anteriores teve resultados extraordinários. E eu estou a ter, em seis anos, resultados extraordinários. Tenho produtos financeiros, vários, que estão a crescer 50%, 60%, 70%, 80%, 90%. Coisa que jamais conseguiria com certificados de aforro, depósitos a prazo ou tendo dinheiro na conta à ordem.

Tenho todo o meu dinheiro em coisas deste tipo? Claro que não! Mas uma parte está, porque acho que isso é importante para preparar o meu futuro e recuperar o tempo perdido.

Espero que estas dicas tenham sido úteis para perceber que uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. Uma coisa é burla financeira, burla bancária, que existiu, foi crime. Atualmente, as pessoas não só sabem mais sobre estes assuntos, não só sabem que perguntas é que devem fazer, como os bancos são obrigados a informar as pessoas sobre as características de cada produto.

O poder está nas nossas mãos, mas também só devemos agir quando temos conhecimento. Leia, ouça, informe-se, faça perguntas. Não tem de decidir por impulso. Em algum momento, experimente, mas com consciência e com literacia financeira.

Boas poupanças!

Aprenda a gerir melhor o seu dinheiro

Neste episódio, sem pretender convencer ninguém a investir, explico como - de facto - funcionam estes investimentos e o que deve saber para não ter medo por simples desconhecimento ou ignorância. Se decidir nunca investir, que seja por estar convencido de que não é mesmo para si e para o seu perfil, mas sabendo como funcionam e os riscos que corre. Isso não tem nada de mal, mas perceba de que pode estar a deixar passar um comboio que poderia mudar a sua vida e da sua família.

Ouça enquanto faz outras coisas.

Boas poupanças!

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