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Como falar de dinheiro aos filhos: as dicas dos especialistas

É de pequeninos que os pais devem começar a ensinar os filhos a lidar com o dinheiro. Quanto mais cedo começarem, melhores resultados podem ter. Na reportagem desta semana do Contas-poupança falámos com uma das maiores especialistas em literacia financeira infantil. Vamos conhecer as dicas mais importantes e os erros que os pais devem evitar ao falar de dinheiro com as crianças. 

Como falar de dinheiro aos filhos: as dicas dos especialistas
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Falar de dinheiro não é só para adultos

A literacia financeira infantil é um tema que merece cada vez mais atenção. Ainda existe a ideia de que o dinheiro é um assunto "de adultos" e que devemos proteger as crianças desta "chatice". Mas essa visão está ultrapassada e pode até ser prejudicial para o futuro financeiro dos nossos filhos.

O dinheiro não é só um problema — é uma ferramenta. Serve para pagar contas, sim, mas também para concretizar sonhos, ganhar liberdade e viver com menos ansiedade. Mesmo quem ganha pouco pode ter uma vida mais tranquila se aprender a gerir bem o que tem. E essa aprendizagem deve começar o mais cedo possível.

Pode ver ou rever a reportagem em vídeo aqui:

Porque devemos começar cedo?

É de pequeninos que os pais devem começar a ensinar os filhos a lidar com o dinheiro. Quanto mais cedo começarem, melhores resultados podem ter. Na reportagem desta semana do Contas-poupança falámos com uma das maiores especialistas em literacia financeira infantil. Vamos conhecer as dicas mais importantes e os erros que os pais devem evitar ao falar de dinheiro com as crianças. 

Cristina Judas é uma das maiores especialistas do mundo em Educação Financeira Infantil. Eu, como pai, compreendi que desperdicei os primeiros anos dos meus filhos em relação a esta parte específica da educação. Isso deve-se ao facto de eu próprio não ter a literacia financeira que deveria ter nessa altura (só percebi os conceitos mais importantes aos 45 anos). Só podemos ensinar o que sabemos, certo? Fiz o meu melhor e espero não ter cometido erros que não sejam possíveis corrigir. Esta reportagem pode ser muito importante, caso seja pai ou mãe. 

Note que o trabalho da Cristina Judas não é com as crianças: é com os pais. As crianças não estão preparadas para lidar com o dinheiro, como nós adultos. Mas devem aprender os conceitos. Isso vai fazer toda a diferença.

Ouça os podcasts sobre este tema:



Quando começar a falar de dinheiro com os filhos?

Entre os 2 e os 5 anos: usar jogos e brincadeiras para explicar que o dinheiro serve para comprar coisas.

A partir dos 6 anos: introduzir uma semanada pedagógica e ensinar conceitos como poupança, planeamento e escolhas.

Os 3 cofrinhos + 1

Os 3 cofrinhos (e mais um que lhe vamos mostrar daqui a pouco) são uma das ferramentas fundamentais para ensinar o valor do dinheiro aos seus filhos. 

Um é para os gastos pessoais dos pequeninos (um gelado, um chocolate, uma saqueta de cromos, etc.), o outro para os sonhos (um brinquedo maior e mais caro, por exemplo), o terceiro para o “tesouro” que é para aprenderem a ganhar dinheiro com o seu dinheiro (o investimento), e o da doação (ensinar a generosidade). 

Cristina Judas é educadora financeira infantil e estuda há muitos anos as melhores estratégias para ensinar os pais a ensinar as crianças a lidar com o dinheiro. A primeira grande lição é que os pais têm de voltar a aprender a brincar (com o dinheiro) e aproveitar essas situações para ensinar conceitos fundamentais.

O segredo para começar a falar com as crianças sobre dinheiro é usar a curiosidade delas a partir dos 2 ou 3 anos. Isso deve começar quando a criança pergunta (ou diz) pela primeira vez que quer “comprar” alguma coisa. Isso significará que percebeu que há um sistema de troca para obter algo (dinheiro ou o cartão multibanco). É nesse momento que tudo começa.

As crianças são esponjas. Um dos principais erros dos adultos é pensar que as crianças entendem o dinheiro como nós, e que elas entendem as nossas explicações. Para falarmos com as crianças sobre dinheiro, temos de aprender a pensar como elas.

Por exemplo, diz Cristina Judas, um dos erros mais cometidos pelos pais - quando uma criança pede uma coisa - é dizer que o pai ou a mãe não tem dinheiro para comprar. As crianças são literais e podem até ficar preocupadas porque para elas “não ter dinheiro”, é mesmo não ter dinheiro.

Dar respostas assim é o caminho mais fácil, mas perde-se uma oportunidade de ouro para começar a ensinar conceitos financeiros que vão ser muito importantes no futuro daquela criança ou jovem. Por exemplo, a resposta deveria ser “Hoje o pai e a mãe não estão preparados para esta compra, mas vamos começar a juntar dinheiro para a podermos comprar no futuro. Queres ajudar?” Estão a ver a diferença?

A importância da previsibilidade

O que as crianças mais precisam na infância é previsibilidade. Saber o que vai acontecer - também com o dinheiro - reduz a ansiedade e as birras. Sobretudo na altura de ir às compras. Fazer uma lista de compras com elas e dar-lhes missões é uma forma muito divertida de ensinar e a comparar preços. Um dos filhos pode ficar responsável por comprar o arroz e o outro os cereais, por exemplo. Ir às compras não tem de ser uma guerra.

A mesada simbólica

Até aos 5 anos, a criança deve receber o que Cristina Judas chama a mesada simbólica: as moedas e notas que vão recebendo esporadicamente e que devem servir para começarem a mexer e a identificar os valores.

A partir dos 6 anos e até aos 12, os pais devem introduzir o conceito de “mesada educativa”. Mas quanto dinheiro devem dar por semana?

 Cristina Judas sugere 1€ por cada ano de idade, mas como isso pode ser demais, pode ser metade desse valor (ou outro definido pelos pais): 7 anos = 7 € ou 3,5 €. Mas não é só dar - é explicar como devem dividir esse dinheiro pelos 4 cofrinhos. Dar dinheiro e não dar orientações não ensina nada aos filhos. Pelo contrário: ensinará que o dinheiro é só para gastar sem critério.

Não pague por tarefas domésticas ou boas notas

Um dos erros de educação financeira que Cristina Judas identifica em muitas famílias portuguesas é os pais pagarem aos filhos para realizarem algumas tarefas em casa ou recompensarem as boas notas. Há coisas na vida que não devem ser pagas: fazem parte da nossa vida em família e da nossa responsabilidade pessoal. Se quiser dar prendas, dê. Mas sem essa ligação direta.

A frustração é uma ferramenta de aprendizagem

Se - usando os cofrinhos - a criança gastar todo o dinheiro e depois não conseguir comprar o que queria, isso também é uma lição. Em vez de cobrir a diferença, é preferível deixar que viva essa frustração num ambiente seguro. Mais vale aprender isso cedo do que entrar em dívidas como adulto.

A importância do exemplo dos pais

Não adianta falar sobre poupança se os pais vivem a usar cartões de crédito. O exemplo dos pais é o maior professor. Se os filhos virem que os pais poupam, planeiam e investem, vão querer imitar.

No meu caso, só comecei a investir aos 45 anos. O meu filho mais velho, com 14, quis comprar ações do Facebook. Comprámos juntos. Percebeu que o dinheiro pode crescer… ou desvalorizar. Aprendeu com um exemplo prático e real. O meu mais novo, já tem um ETF SP500 desde os 12 anos e vê diariamente como ele está a comportar-se. A minha ideia não é ele ganhar dinheiro nesta fase, é ganhar conhecimento.

Introduza o conceito de juros compostos (sim, mesmo em miúdos)

Pode parecer um tema difícil, mas até as crianças conseguem perceber se usarmos uma linguagem simples. Por exemplo: “Se poupares 1 euro hoje e ele crescer todos os meses, daqui a um ano tens mais do que 12 euros.” A ideia é mostrar que o tempo é o melhor amigo do dinheiro.

Se quiser ir mais longe, use produtos como Certificados de Aforro ou simulações online. Mostre como o dinheiro cresce ao longo do tempo, mesmo com pequenos valores.

Aproveite o dia-a-dia como escola

Todos os momentos podem ser usados para ensinar:

  • Fazer a lista de compras juntos.
  • Comparar preços no supermercado.
  • Explicar porque é que não se compra tudo o que se vê.
  • Envolver os filhos na decisão sobre como gastar o próprio dinheiro.

Comece hoje

A melhor forma de garantir um futuro melhor para os nossos filhos é dar-lhes desde já ferramentas para tomarem boas decisões. A literacia financeira infantil começa com uma carteira de brincar, passa por um cofrinho (ou mais) e, mais tarde, pode chegar a um investimento consciente.

Falar de dinheiro com os filhos não é um tabu — é uma das maiores provas de amor que podemos dar. Ensinar que o dinheiro pode ser uma fonte de paz e não de stress é das maiores heranças que lhes podemos deixar.

Se é pai ou mãe, comece por aprender, depois ensine. Se já começou, continue. Nunca é tarde para começar.


Disponível online, livrarias e supermercados.