
O benefício para as crianças que “usam óculos” depende só dos médicos
Tem abaixo a reação enviada hoje pelo Ministério da Segurança Social às redações, para esclarecer as dúvidas que estão a surgir com a “avalancha” de pedidos deste subsídio.
Para quem não sabe do que estamos a falar, recentemente espalhou-se como fogo nas redes sociais uma informação que basicamente diz que todas as crianças que usam óculos têm direito a um “subsídio” de 62 euros por mês até aos 24 anos. Estou a simplificar a informação de propósito para que perceba o que está a acontecer. Claro que esta informação foi partilhada dezenas de milhares de vezes e os médicos começaram a ser inundados de pedidos de Declarações para serem entregues na Segurança Social.
Acontece que para surpresa de muitos, apesar das “deficiências” não serem graves, estas famílias começaram DE FACTO a receber os 62 euros por mês. Em alguns casos bastava mesmo usar óculos, mesmo com graduações relativamente normais. Chegaram-me também relatos de casos de crianças que recebem os tais 62 euros por mês porque têm pele atópica, sofrem de hiperatividade, fazem terapia da fala, sofrem de asma ou até por usarem aparelhos dentários.
Dezenas de médicos consideram que as crianças não podem ser consideradas deficientes porque usando medidas corretivas (óculos ou outros aparelhos) as crianças têm uma vida normal e recusam-se a preencher os formulários. E criam-se conflitos com os pacientes. E pediram mais informações ao Ministério da Segurança Social, que respondeu hoje.
Pode ler aqui o comunicado do Sociedade Portuguesa de Oftalmologia. Parece-me ser uma posição sensata, mas não anula o que diz a lei, que é aberta o suficiente para permitir várias leituras.
Vamos então ao esclarecimento na íntegra do Ministério, para os pais ficarem a par do que podem esperar.
Esclarecimento sobre a atribuição da bonificação por deficiência
O Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social esclarece o seguinte:
1. A bonificação por deficiência é uma prestação em dinheiro que acresce ao abono de família das crianças ou jovens com deficiência, com o objetivo de compensar as suas famílias dos encargos resultantes da sua situação.
2. A bonificação por deficiência não se destina em específico a óculos, mas sim, como referido no ponto 1, a compensar as famílias dos encargos resultantes da sua situação de deficiência das crianças ou jovens.
3. A bonificação por deficiência está prevista na Lei (Decreto-Lei 133-B/97, de 30 de maio) há 22 anos. Esta prestação não foi criada ou alterada por este Governo.
4. O facto de criança ou jovem possuir qualquer perda ou anomalia de estrutura ou função não confere por si só direito à bonificação por deficiência. O reconhecimento do direito a esta prestação depende da existência de deficiência, a qual, nos termos do art.º 21.º do Decreto-lei n.º 133-B/97, de 30 de maio, é entendida como perda ou anomalia congénita ou adquirida de estrutura ou função psicológica, intelectual,
fisiológica ou anatómica, em função da qual seja necessário o recurso aos apoios pedagógicos ou terapêuticos, como meio de impedir o seu agravamento, anular ou atenuar os seus efeitos e permitir a sua plena integração social.
Neste sentido, a caracterização da deficiência tem sempre por base critérios médicos na avaliação das diferentes situações, constituindo a certificação da deficiência a materialização da prova, que se pretende clara e inequívoca quanto à necessidade dos apoios a prestar.
5. A bonificação por deficiência pode ser requerida na Segurança Social mediante a apresentação de um requerimento que incorpora um certificado médico que ateste a existência de deficiência nos moldes já descritos no ponto 4. Assim, é da total responsabilidade dos médicos atestar o tipo de deficiência, a natureza da deficiência e se esta, a existir, tem ou não efeitos e quais para o desenvolvimento da criança.
6. Desde há 22 anos que são os próprios médicos que atestam a deficiência nos moldes definidos por lei, dentro das suas competências médicas e ao abrigo dos respetivos estatutos e código deontológico.
7. Não cabe aos serviços da Segurança Social contestar pareceres clínicos.
8. Tem sido com estes pressupostos e com este modelo que, desde há 22 anos, é atribuída a bonificação por deficiência.
9. Tendo o Instituto de Segurança Social verificado um acréscimo localizado de requerimentos para bonificação por deficiência, está a averiguar as causas desse aumento e identificará as medidas que eventualmente venham a ser necessárias e ajustadas tomar.
O que fazer?
Em resumo, o Ministério da Segurança Social empurra para os médicos a avaliação do que é ou não uma deficiência e não se quer meter nisso, pelo menos para já. Este benefício agora conhecido assim inesperadamente é MUITO IMPORTANTE para milhares de famílias para quem vai ser mesmo uma grande ajuda. Essas famílias que têm filhos realmente com uma deficiência clara peçam por favor este Benefício. É um direito que têm. É fácil pedi-lo. Vão ao site da Segurança Social, imprimem os dois formulários, levam ao médico, ele preenche e entregam na Segurança Social. Só isto. Não tem de ter Atestados de Incapacidade Multiuso ou afins.
Quem nunca pensou nisto, nem nunca considerou que o filho ou filha tinha uma deficiência, e agora acordou para este benefício terá de avaliar se conscientemente o deve pedir ou não. Neste momento não faço nenhum juízo de valor sobre isso porque eu próprio ponderei se deveria pedir ou não. Pago impostos, está na lei e numa pespectiva absolutamente factual uma criança que usa óculos ou outro tipo de aparelhos tem uma deficiência (pode não ser grave) mas tem. Eu uso óculos desde os 2 anos, logo tenho uma deficiência de visão. Consultas e óculos uma vez por ano são despesas que famílias que têm filhos completamente saudáveis não têm. Há famílias que gastam pequenas fortunas em cremes e produtos específicos para quem tem pele atópica. Ou gastam muito dinheiro em terapias. Mas posso descontar parte desse valor no IRS nas despesas de saúde. Portanto, ainda vai correr muita tinta. Vamos esperar por mais desenvolvimentos. Até lá, pede a Bonificação por Deficiência quem quiser, e espera pela decisão. Ou é aceite ou não.